segunda-feira, 31 de março de 2008

Pesquisa

Lédio Rosa de Andrade
Doutor em Direito e Psicanálise pela Universidade de Barcelona
Desembargador (TJSC)

Entre um grande número de teorias sobre o conceito e funções da universidade, prepondera a que aponta o ensino, a pesquisa e a extensão como seus pilares básicos. Mas isso não é pacífico. Existem, inclusive, aqueles que combatem a compreensão em separado das funções, afirmando não haver ensino sem pesquisa, e vice-versa. O certo é que se pode construir muitas teorias, e que toda classificação é sempre duvidosa. Mas, para facilitar, parece-me interessante ver o ensino como a transmissão do conhecimento já existente; a pesquisa como a produção do conhecimento novo; e a extensão como a aproximação da academia com a população.

E, entre essas funções universitárias, a pesquisa se destaca como a mais difícil, mas, ao mesmo tempo, a mais importante, pois responsável direta pela evolução da própria humanidade. Cada pesquisa feita é um passo a mais no progresso de nossa espécie. É corolário de pesquisas que a vida média do ser humano pulou de 26 anos no paleolítico superior, para em torno de 75, no atual momento histórico. Mas as bombas atômicas e outras também dela surgiram.

Entre prós e contras, a pesquisa experimental é a base da ciência, e é esta quem determina o conceito de verdade. Essa função, outrora, era monopólio dos religiosos, mas, a partir do positivismo científico, passou às mãos dos cientistas, para o bem de toda a humanidade. E isto se funda em uma questão epistemológica. Antes, a verdade era uma questão de crença. Os membros da igreja afirmavam que algo era verdade, porque deus disse. E todos acreditavam. Entretanto, com a preponderância da ciência, afastou-se a crença e, em seu lugar, veio a experimentação, ou seja, quando um cientista ou qualquer outra pessoa afirma que algo é verdade, imediatamente vem a assertiva: então demonstre.

A demonstração é a essência da pesquisa. Em palavras bem simples, a base da experimentação pode assim ser entendida: parte-se de uma hipótese ou uma afirmação provisória, como por exemplo, “Se soltar-se um corpo sólido no ar, ele cai. Há uma força na natureza que atrai os corpos sólidos para o solo.” Para provar isso, o pesquisador utiliza vários tipos de corpos sólidos, em vários ambientes, sem qualquer interferência (controle das variáveis) e, em todas as vezes, eles caem. Portanto, fica experimentalmente comprovado que, de fato, os corpos caem. A isso também se chama experiência empírica, pois efetuada a partir da observação da realidade. Com essa prova, a hipótese vira uma Lei (até que seja demonstrado o contrário), à qual se dá um nome: no caso, Lei da Gravidade.

Agora digamos que um religioso ou místico afirme que tem poderes de erguer corpos sólidos e de curar pessoas. Antes, bastava acreditar, agora tem de provar. E, para provar, ele tem de ir a um ambiente neutro, com controle de todas as possibilidades de interferência, como um laboratório de física de uma universidade. E, ali, observado por cientistas, deverá erguer os corpos e curar as pessoas. Se não fizer isso, repetitivamente, sua hipótese não se torna Lei, e ele passa a ser considerado um mentiroso. Esse é o grande avanço da ciência: exigir demonstração. E é por isso que todos os milagres são feitos fora dos laboratórios.

A pesquisa torna-se mais complexa nas ciências sociais, pois, nessa área do conhecimento, nem sempre é possível uma demonstração empírica clara, através da experimentação. Mas, mesmo diante dessa e de outras dificuldades, a interferência da ideologia e do inconsciente na prática do investigador entre elas, trata-se do caminho mais confiável para se estabelecerem verdades, sempre provisórias.

Por isso, os países desenvolvidos possuem grandes universidades, todas produzindo pesquisas de qualidade. Em nossa terra, com ar de sabedoria, para não dizer de ufanismo, há quem pense ser função da universidade movimentar o mercado local. Constrangedor, para todos.

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