sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Candidatos a prefeito debatem Universidade Comunitária




Dia 11 de setembro, no Auditório Ruy Hulse, campus da UNESC, os quatro candidatos a prefeito de Criciúma (Acélio Casagrande, Clésio Salvaro, Décio Góes e Odelondes de Souza) participaram de debate com o tema "Universidade comunitária e poder público municipal".O evento foi uma iniciativa do GIEDUC e da OAB/Subseção Criciúma e lotou as dependências do local onde foi realizado. Estima-se que mais de quinhentas pessoas assistiram ao debate, que transcorreu sem incidentes. Professores e alunos de diversos cursos estavam presentes, além de funcionários da casa.Segundo o Coordenador do evento, Prof. Sergio Graziano, os objetivos foram atingidos: "A idéia era sensibilizar os candidatos para as especificidades de uma universidade comunitária, que é uma instituição pública mas que não é estatal. Nem todos reconhecem as conseqüências desta situação peculiar. Além disso, dos quatro candidatos, três são deputados em pleno exercício do mandato, por isso foi tão importante te-los ali", avalia.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

A universidade comunitária diante das questões ambientais

Mauricio Ruiz Câmara
Professor na UNESC
Falar do papel da universidade comunitária diante das questões ambientais pressupõe contextualizar e compreender a crise ambiental enquanto processo engendrado pela relação da sociedade com a natureza e compreender no cenário mundial o capitalismo e a busca contínua da produção de mercadorias, que tem suas bases no conhecimento técnico-científico-informacional e nas novas formas flexíveis de produção e acumulação, bem como situar historicamente a universidade, pois corremos o risco de reproduzir os discursos que ensinam que o caminho das instituições de ensino superior é vender serviços e tecnologias ambientais sem questionar sua responsabilidade e os interesses que estão colocados em questão. Antônio Carlos Robert Moraes, na obra “Meio ambiente e ciências humanas”, me auxilia na análise.
Até o século XIX, a riqueza das nações se dava pela exploração das colônias; no século XX a riqueza no capitalismo monopolista ocorre pela exploração dos países em desenvolvimento; no século XXI, no capitalismo globalizado, há uma corrida pela apropriação da biodiversidade humana, das florestas e da fauna (genética e laboratórios), culminando nas patentes e desenvolvimento de novos medicamentos e tecnologias. Aliam-se a este quadro a crise das matrizes de energia, notadamente o petróleo, a crise da água (acesso e disponibilidade natural) e o contexto de guerras e conflitos vividos atualmente no mundo.
Estes movimentos ampliam as desigualdades e contradições no mundo e ganham contornos específicos no Brasil, que foi colônia de exploração, gestou uma sociedade escravocrata e foi palco de sucessivas ditaduras, que em diferentes momentos imprimiram uma visão de desenvolvimento a qualquer preço e de acordo com as conveniências e interesses cartoriais, e que atualmente tem no neoliberalismo, um movimento que solapa a base social e pública do seu patrimônio ambiental (floresta, rios e mar – biodiversidade).
Na atualidade, o país experimenta um movimento gigante de expansão das fronteiras agrícolas no Cerrado e na Amazônia (monocultura, Blairo Maggi), bem como um crescimento acelerado, desordenado e violento das cidades (crise urbana). Na região sul catarinense, duas questões estão na pauta ambiental: o retorno, de forma incisiva e truculenta, da exploração e beneficiamento do carvão e a expansão da agricultura do arroz, contaminando com metais pesados e agrotóxicos praticamente toda a extensão sul do estado, incluindo atmosfera, solo, subsolo, rios e lagoas.
As resistências aos processos excludentes ocorrem por todo o país, realizada por indígenas, povos ribeirinhos, trabalhadores sem terra, trabalhadores sem teto e pelo movimento ambiental e outros setores menos organizados. Porém, pela escala e dimensão dos problemas, a resistência torna-se insuficiente para mobilizar e despertar a consciência social na sua totalidade.
Neste contexto, observamos de um lado o capital buscando sua realização e reprodução ampliada e de outro o movimento social fazendo resistência e propondo alternativas concretas para a transformação social. Neste movimento contraditório entra a universidade comunitária.
A universidade não é o principal agente dos embates, ela realiza leituras do contexto mais amplo e interage com os segmentos sociais. Porém, a contradição da sociedade é a contradição interna da universidade. Desta forma, a universidade incorpora as contradições da sociedade, pois trabalha com uma diversidade de agentes e profissionais em seus quadros e diferentes interesses estão postos. E o que norteia a ação de uma universidade notadamente comunitária?
Se a universidade reproduz a sociedade a contradição não se resolve, pois está incorporada a contradição. Assim, não é o principal sujeito da transformação social e sequer da degradação ambiental, e o conhecimento (re)produzido não é um saber que se coloca acima da sociedade, pois as decisões fluem por canais próprios do movimento social.
A universidade comunitária deve estabelecer uma interface com a sociedade, e neste contexto o cientista aparece com um cidadão, colocando o saber técnico a serviço da sociedade civil. Neste movimento, a universidade reforça a relação com a sociedade que a mantém.
Uma postura prudente é manter eqüidistância com governos, porém, manter interlocução com órgãos públicos, sendo o lócus permanente de avaliação e crítica das políticas públicas.
A universidade comunitária deve primar por uma postura ética nos trabalhos científicos que realiza, acentuando uma formação crítica em todas as especialidades, não se baseando numa racionalidade técnica instrumental.
A universidade comunitária tem relevante papel social, mas não é neutra e deve avaliar a todo o momento a favor de quê e a favor de quem está a serviço. Não pode perder o foco educativo em suas atividades, pois esta é sua possibilidade de intervenção social.
Uma universidade comunitária não pode se subordinar às empresas e interesses na execução de trabalhos ambientais, pois coloca em riscos sua credibilidade e dá margem para legítimos questionamentos e críticas.
Finalmente, a universidade comunitária deve manter constante avaliação da sua atuação social, desenvolvendo internamente mecanismos de auto-avaliação da aplicação da sua política ambiental, base para sua atuação na sociedade.

UNIVERSIDADE E DESENVOLVIMENTO: Uma abordagem sociológica, segundo Florestan Fernandes. (Parte I)

Antonio Luiz Miranda
Historiador
Florestan Fernandes (1920-1995) é considerado uma das grandes figuras da sociologia crítica do Brasil. Um tema marcante de sua vasta obra foi o debate em torno do papel da universidade na sociedade brasileira.
Neste espaço, pretendo comentar um texto do autor que trata do tema e que foi, a princípio, uma palestra proferida em 1968 aos alunos da Faculdade de Direito da USP, a convite do Centro Acadêmico XI de Agosto, mesmo com a proibição do diretor da Faculdade na época.
Universidade e desenvolvimento foi um dos aspectos discutidos por Florestan Fernandes na ocasião. Partia da idéia que a universidade pode ou não contribuir para o desenvolvimento e como o desenvolvimento contribui para modificar a universidade.
Na perspectiva sociológica, Fernandes utilizou o conceito durkeiminiano que entende que “as instituições compõe ou formam a sociedade”, mas é a sociedade que determina as instituições. Com isso, o autor critica a idéia, que para ele são de “senso comum”, que entendem as instituições como sendo auto-suficientes e se determinam por si mesma. Isto é, “bastaria uma boa organização e uma boa direção, para se ter um bom rendimento ou um rendimento ótimo”.
Na condição de sociólogo Florestan Fernandes estudou a universidade brasileira a partir da análise da realidade histórico-social. Afirma que a universidade brasileira tem raízes no modelo europeu e só chegou ao Brasil com a vinda da família real portuguesa e instalação da corte no Rio de Janeiro.
Porém, dada a estrutura senhorial-escravista da sociedade brasileira da época, o modelo ao ser “transplantado” para o Brasil, sofreu 3 tipos de empobrecimento:
Primeiro: o que se instalou no Brasil não foi universidade, mas faculdades e escolas superiores, inspiradas numa política educacional “estreita e imediatista”, influenciada pelas elites locais.
Segundo: para Florestan Fernandes, apesar de todas as condições adversas, a universidade portuguesa, até certo ponto, “preenchia as funções de investigar e produzir conhecimento”. No Brasil, no entanto, prevaleceu o modelo dependente. O exemplo pode ser visto no Direito, que mesmo após a independência não rompeu com direito português herdados da era colonial.
Terceiro: Trata do drástico empobrecimento funcional dos modelos importados, a escola superior serviu apenas para conferir diplomas para o exercício das profissões liberais como, a advocacia, a medicina e a engenharia, mas a formação mesmo, se dava na vida prática, dada a deficiência dos cursos.
Estes elementos representam, de forma resumida, como historicamente o ensino superior chegou e se implantou no Brasil. É interessante observar que muitas instituições de ensino superior atualmente mantêm a lógica de se prestar apenas a emitir diplomas e buscar lucro.
As análises de Florestan Fernandes aprofundam mais detalhes fundamentais do modelo de universidade brasileira, os quais serão abordados na segunda parte.

Ex-reitor diz que Gieduc é pioneiro na retomada do debate sobre tema no país

"Individualmente vivemos um tempo menor que o necessário para experimentar as mudanças. Perdemos nossa capacidade de transcender, de se tornar humano, de olhar para além de si mesmo, porque o egoísmo e o individualismo dominam as relações atuais. Este encontro me deixa muito feliz porque vem na direção contrária a tudo isso. Ao promover este encontro, vocês estão sendo pioneiros capazes de retomar os caminhos da humanidade, porque estão resgatando esta transcendência e a caminhada pela inclusão dos jovens na universidade. O Gieduc é pilar mestre da retomada da briga pela universidade comunitária neste país." A afirmação foi feita esta manhã (21) no auditório Ruy Hülse pelo ex-reitor da Unijuí, professor doutor Walter Franz. Considerado uma das maiores autoridades científicas do país nas pesquisas sobre Comunitarismo, ele esteve na Unesc à convite do Grupo Interdisciplinar de Estudos e Debates sobre Universidade Comunitária (GIEDUC) abrindo o Ciclo de Debates. A atividade foi coordenada pelos professores doutores Ilton Benoni e Sérgio Graziano. Também foi lançado o blog da Universidade Comunitária, que poderá ser acessado pelo endereço universidadecomunitaria.blogspot.com. ConcepçõesO ex-reitor iniciou sua fala lembrando que as concepções de universidade comunitária são concepções históricas e, como tais, são resultado da política, da economia, da cultura e da sociedade e que, infelizmente, perdeu-se muito desta característica. "Os bancos, o agronegócio, brigam e ganham. E nós, das comunitárias, não fazemos isso, esquecemos. Vale a pena brigar, sim", disse. Para o professor, a universidade é um lugar muito especial, uma ponte entre o universal e o particular, entre o global e o local, lugar do debate, lugar aberto para engajar-se, onde as pessoas devem ir para falarem, para debaterem seus problemas, suas necessidades. Também é o lugar de formação e qualificação, onde o ser humano possa capacitar-se. Lugar que deve se relacionar com o mercado e os governos, mas que deve ir muito além disso, porque cabe a ela interpretar o mundo. "Formar bons médicos, administradores, engenheiros faz parte do seu papel, mas sua função não é só isso e não pode se resumir nisso", falou. "A universidade é o lugar da liberdade, inclusive para respeitar a liberdade do outro". Novo modeloO palestrante falou que na prática da organização e do funcionamento do ensino superior brasileiro, se constata a existência e a construção de um novo modelo de universidade. Nesse novo modelo, o termo comunitário aparece como a idéia força que agrega para a viabilidade de um projeto comum. Comunitário, segundo ele, dá a entender muita coisa, a começar a partir de onde ele se situa, da universidade ou da fundação mantenedora da mesma. A imprecisão conceitual, por outro lado, diz o pesquisador, diminue quando se materializa em ações sociais, desperta identidade, mobiliza intenções e ações. Universidade comunitária, para Franz, deve ser entendida como parte da construção e ampliação dos espaços da esfera pública-não estatal nos quais os deveres e os direitos da educação são discutidos e construídos. "A universidade não é um supermercado", advertiu. "Precisamos organizar esses espaços, mobilizar-se frente ao Estado, para que ele tenha maior compromisso com este espaço, que canalize mais recursos onde está a maioria dos nossos jovens."Frases - Cerca de 20% da humanidade cabe no modelo econômico e político atual e 80% está excluída. Não gostaria de passar por aqui sem falar da minha indignação sobre isso. - A humanidade precisa ser reorientada para o comunitarismo. Autores dizem que precisaremos de 150 anos para isso. Sou mais otimista, e acredito em menos tempo.- O conteúdo ideológico é tanto maior quanto menor for a abertura do projeto em direção à participação da sociedade civil. - O novo modelo não nasce do núcleo do poder público-estatal, mas na sua periferia, muito mais como expressão de vozes populares, da ausência do Estado, do que da liberdade constitucional ou da possibilidade legal existente em favor da iniciativa privada no campo da educação. - Sua construção (do novo modelo) atua como processo pedagógico de educação e capacitação política de seus integrantes.- Das mais de 2.200 instituições de ensino superior existentes no Brasil, menos de 170 são universidades. Dessas, menos de 10% são universidades comunitárias.- Santa Catarina tem 10 universidades comunitárias e o Rio Grande do Sul tem oito. Juntas, somos mais de 10% das universidades brasileiras.
Jornalista Responsável: Janete Triches

Matéria completa, com fotos: http://www.unesc.net/noticias/index.php?id=3609

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Ata de constituição do GIEDUC

Ata de constituição do GIEDUC

Aos quatro dias do mês de junho do ano de dois mil e oito, sede da APROFUCRI, na cidade de Criciúma, às 22h e 30 min, reuniram-se as pessoas ao final assinadas, oportunidade em que foi discutida e deliberada a criação, constituição e publicização do Grupo Interdisciplinar de Estudos e Debates sobre Universidade Comunitária (GIEDUC), conforme as seguintes características, princípios e objetivos: O GIEDUC, Grupo Interdisciplinar de Estudos e Debates sobre Universidade Comunitária, é um grupo de estudos e de promoção e difusão do debate sobre a experiência de educação superior em geral e da educação superior comunitária em especial, constituído por pessoas de diversas áreas do conhecimento - docentes, discentes e funcionários de instituições de educação superior, bem como egressos de tais campos –, com caráter plural, sem vinculação partidária e sem fins econômicos, cuja atuação é pautada em decisões colegiadas, com fundamento nos seguintes princípios e objetivos:

Princípios

1 - Comunitarismo como valor necessário e preponderante nos processos educacionais e de produção de conhecimento;

2 - Pluralismo e laicidade de idéias e de concepções;

3 - Democracia como valor a ser materializado em todos os espaços da ação;

4 - Supremacia da colegialidade das decisões;

5 - Publicidade e transparência de ações;

Objetivos

1- Fomentar estudos e debates acerca da educação superior comunitária, buscando discutir métodos e formas de gestão participativa e estudar e divulgar experiências emancipatórias na educação superior nos contextos local e nacional;

2- Promover a articulação e a integração de docentes, discentes e funcionários de IES que comunguem os princípios acima elencados;

3- Realizar, promover e/ou estimular estudos, pesquisas, colóquios, jornadas, congressos, seminários, mesas redondas, publicações, manifestações e cursos sobre temas ligados à educação superior universitária comunitária.

Decidiu-se, ademais, que para a consecução de seus objetivos, o GIEDUC, formado originalmente pelos aderentes a este ato de fundação e aqueles que por ventura, após esta data, integrarem as ações do grupo, as deliberações serão sempre colegiadas, utilizando-se de lista virtual e o blog (universidadecomunitaria.blogspot.com) como espaços de divulgação e debate. Nada mais havendo, segue a presente ata assinada pelos presentes.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Unisul: Coronelismo em pleno século 21

Lucas Borges *

(Publicado originalmente em http://www.engeplus.com.br/conteudo.php?int=noticia&codigo_not=8761)

Na prática, a Unisul tem dono. Na teoria, ou na lei do município de Tubarão (mais especificamente a lei nº1389/89), a Universidade do Sul de Santa Catarina é uma fundação municipal. Para facilitar o entendimento de quem não vive a realidade daquela instituição, vamos aos fatos.

O Conselho Universitário aprovou a antecipação da "eleição" para a reitoria da universidade, que estava prevista para setembro, mas já está acontecendo em pleno mês de maio. Ninguém se preocupou ainda em dar uma explicação ou justificativa para tal ação. O atual reitor Gérson Luiz Joner da Silveira, depois de sete anos de mandato, decidiu quem será seu sucessor, digo, já escolheu os nomes que participarão das "eleições" na condição de chapa de situação. Trata-se de Aílton Nazareno Soares, atual diretor do campus da Grande Florianópolis, para reitor, e Sebastião Salésio Herdt para vice-reitor, mesmo cargo que ocupa atualmente.

Não me surpreendi quando me deparei nessa semana com um Edital da Comissão Eleitoral, datado de 09/05/2008, informando que apenas uma chapa estava inscrita para a eleição da reitoria da Unisul. Ainda que tivéssemos uma chapa de oposição (o que parece piada), quem tem direito a votar são os coordenadores de cursos, sem estabilidade de emprego, e o Conselho Universitário, escolhido pelo reitor.

É válido lembrar que na Unesc todos os acadêmicos, professores e funcionários votam. Os candidatos a reitor apresentam propostas de gestão e debatem ações com estudantes e os concorrentes ao cargo. Estou há quatro anos na Unisul e, assim como a grande maioria de acadêmicos, professores e funcionários, só "conheço" o atual reitor por foto. Mais grave ainda é constatar, baseado em informações da última reunião do conselho, que no balanço da atual gestão existe uma diferença gritante nos investimentos feitos nos campi de Tubarão e Florianópolis. Somente no último ano de mandato, a atual gestão investiu aproximadamente R$ 1,7 milhão no campus do sul, enquanto no da capital o investimento gira em torno de R$ 9 milhões.

É o coronelismo do século 21 enquanto muitas pessoas acreditam que esse modelo autoritário teve fim em 1930. Do mesmo modo pode parecer coisa do passado o movimento Diretas Já!, mas pasme: ou os acadêmicos da Unisul vão às ruas com as caras pintadas ou vão manter atadas as mordaças impostas por uma universidade que, por ironia do destino, foi criada em 1964. *

Presidente do Centro Acadêmico de Comunicação Social / Unisul / Tubarão

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Universidade Comunitária: Da utopia para topias possíveis

Professora Leila Lourenço
e-mail:leilalourencocdp@hotmail.com

Há um livro, escrito em 1985, por alguns autores brasileiros conhecidos no meio universitário por suas idéias e práticas transformadoras do fazer e do pensar sobre o lugar que ocupa uma universidade na sociedade brasileira. Esse livro nasceu da reunião deles, professores universitários, que militantemente, discutiam e definiam qual deveria ser o papel de sua disciplina na universidade e na discussão sobre universidade. Essa disciplina era a Metodologia Científica, o livro “Fazer Universidade: Uma proposta metodológica”(Cortez) e os autores Cipriano Luckesi, Elói Barreto, José Cosma e Naidison Baptista.

Eles trazem , por exemplo, à memória, o importante papel de um outro educador, chamado por eles de profeta, Anísio Teixeira, que lá nos idos da década de 1930 já refletia sobre algo que ainda não ocorre em muitas universidades, lembremos o seu clamor:
1- A universidade deve ser um centro de debates livre de idéias e
2- que “[a]universidade brasileira, além de preparar profissionais para as carreiras liberais e técnicas que exigem uma formação de nível superior, o que tem havido é uma preocupação muito fluída com a iniciação do estudante na vida intelectual. Daí poder-se afirmar que, ressalvando o aspecto habilitação profissional, a universidade brasileira não logrou constituir-se verdadeiramente como uma instituição de pesquisa [...], nem logrou se tornar um centro de consciência crítica e de pensamento criador” ( Apud LUCKESI et al, 1985, p.35)

Esses professores defendem amplos debates sobre a concepção, organização e funções de uma universidade. Eles defendem e têm a coragem de dizer, por exemplo, que querem uma universidade democrática voltada inteiramente para as lutas democráticas, e mais, que o corpo universitário, professor-aluno e administração, necessita de espaço para assumir, cada um a seu nível a responsabilidade pelo todo. E são bem explícitos quando dizem : “ pretendemos um corpo universitário que lute para eleger seus diretores a partir de critérios que correspondam aos objetivos da Universidade. Um corpo universitário não mais deve presenciar passivamente a nomeação de dirigentes universitários estribada em critérios antidemocráticos de simpatia, serviçalismo e subserviência ao poder dominante, político ou econômico.(Idem, p.44)

Quero, por fim, terminar de contar sobre as memórias que achei importante “desmemoriar” nesse livro, que é atual e que junto minha voz a deles quando dizem: “Queremos, enfim, uma universidade onde possamos lutar para conquistar espaços de liberdade. Enquanto pensamos livremente, questionamos livremente, propomos livremente e livremente avaliamos a nossa responsabilidade . (Ibidem, p.44)

quarta-feira, 23 de abril de 2008

O CONSELHO DO REI NA UTOPIA DE THOMAS MORE (Diálogo II)

Carlos Renato Carola – Professor Universitário

Utopia significa “lugar que não existe”. Inspirado no modelo da República de Platão, Thomas More (1478-1535) narra a história de uma ilha imaginária, descoberta pelo filósofo-viajante Rafael Hitlodeu (personagem também imaginário), estabelecendo uma comparação entre o real e o ideal. Utopia – obra publicada em 1516 – representa a sociedade idealizada e a Inglaterra a sociedade corrompida, segundo os parâmetros e a visão de More, filósofo e diplomata que foi decapitado por se recusar a avalizar a separação da igreja anglicana da católico-romana. Embora a História tenha revelado a face trágica das experiências utópicas baseadas em ideais de justiça e igualdade, o método comparativo usado por More ajuda a pensar nas possibilidades de superar problemas e vícios da cultura política do presente. Eis, portanto, o objetivo deste breve diálogo.

Rafael Hitlodeu (o personagem fictício de More) nasceu em Portugal; estudou filosofia e se aventurou nas viagens de Américo Vespúcio. Nas viagens conheceu burgos e cidades bem administradas, nações e Estados poderosos; conheceu povos e instituições tão ruins como os da Europa, assim como instituições, leis e costumes capazes de “regenerar as cidades, nações e reinos da velha Europa.” Durante suas viagens se preocupou em analisar detalhadamente as formas de governos das diferentes nações encontradas.

Por sua experiência e sabedoria, More sugere a Rafael – o filósofo-viajante - que seus conhecimentos seriam de grande utilidade para algum rei e que isso poderia lhe trazer vantagens pessoais. Mas Rafael diz não ter apego a bens materiais e nem acumularia ouro para se tornar escravo de um rei. Além disso, argumenta que “muita gente ambiciona os favores do trono”; por isso, “os reis não sentirão falta, se eu e dois ou três da minha têmpera não nos encontrarmos entre os cortesãos.”

More insiste que Rafael deveria usar seus conhecimentos e talentos para o “bem público”, aproximando-se de um rei ou sendo um dos seus ministros, uma vez que o príncipe era “a fonte de onde o bem e o mal jorram como uma torrente sobre o povo.” Rafael replica salientando dois erros no ponto de vista de seu interlocutor. Primeiramente, ressalta que os príncipes priorizam a guerra, coisa que ele diz não ter conhecimento e nem desejo de conhecer. Em seguida, comenta as artimanhas e mediocridade que imperam no seio do Conselho Real. No Conselho de ministros do rei, diz Rafael, predomina os piores tipos em termos de caráter; há o tipo que se cala por inépcia; os que sabem, mas preferem aplaudir as “imbecilidades” do favorito do rei; e aqueles que só sabem ouvir a própria opinião. De um modo geral, predominava o perfil daqueles que tinham interesse próprio e ambição por poder e riqueza. Portanto, More caracteriza (por meio de seu personagem imaginário) o Conselho do rei como um espaço onde reinava a inveja, a vaidade e o interesse particular.

More persiste no diálogo com o filósofo-viajante; insiste na idéia de que os conselhos dele “seriam de uma alta utilidade pública”, principalmente se fossem para vencer o “horror” que inspiravam os reis e as cortes. Mais enfático ainda, More indaga que o papel do “bom cidadão” era sacrificar “suas ojerizas particulares” em prol do interesse geral; evoca as palavras de Platão, quando disse que “a humanidade será feliz um dia, quando os filósofos forem reis, ou quando os reis forem filósofos”; e ainda questiona Rafael dizendo que tal felicidade fica mais longe de se tornar realidade quando “os filósofos nem ao menos se dignam assistir os reis com seus conselhos!”

Rafael replicou mais uma vez os argumentos do seu interlocutor. Mas suponhamos, argumenta o mesmo, que eu fosse um ministro do rei; um ministro preocupado com o bem público e obstinado em combater os germes do mal existente no coração real e em seu reino. “Acreditais que não me expulsará da corte ou que não me exporá ao risco dos cortesãos?”. Ora, caro More, nesse tipo de Conselho, o que um filósofo preocupado com o bem público e a felicidade geral do povo pode fazer? Que reação teria o rei e seus ministros diante de uma proposta que contrariasse a lógica da intriga, da ambição, da riqueza e da guerra? De forma irônica, Rafael descreve a seguinte situação: “- Senhor, aproveitai a paz que um feliz acaso vos concede, cultivai o reino de vossos pais, fazei nele florescer a felicidade, a riqueza e a força; amai vossos súditos, e que o amor deles faça a vossa alegria; vivei como pai no meio deles e não comandeis nunca como déspota; deixai em paz os outros reinos; aqueles que vos coube por herança é suficientemente grande para vós.”

Então, More lança um último argumento. Se no âmbito dos negócios do Estado e no seio do Conselho Real não se pode, de uma só vez, derrotar as artimanhas perversas e muito menos afugentar os costumes imorais, isso não é razão para abandonar a causa pública; “e, se vossos esforços não puderem servir para efetuar o bem, que sirvam ao menos para diminuir a intensidade do mal.” Rafael compreende a preocupação do seu interlocutor, mas reafirma sua visão em relação ao jogo do poder existente no seio do palácio real. Lembra que a moral de Cristo não condiz com os costumes do mundo real e que o Evangelho foi ajustado de acordo com “os maus costumes dos homens”.

Assim, naquela tradicional cultura política, seja na Inglaterra, na França ou mesmo em outra nação européia, era inútil tentar aconselhar o rei no sentido do bem público, do bem comunitário, pois “o ar que aí se respira corrompe a própria virtude.”. Além disso, Rafael não acredita na possibilidade de igualdade e justiça social numa sociedade edificada sobre os pilares da propriedade privada e a lógica do dinheiro. Mas, se não havia “esperança em transformar o mal em bem” numa sociedade corrompida e decadente, More focaliza uma luz de esperança na república de Utopia, ou seja, num novo modelo de sociedade; e nessa sociedade idealizada, ele traça os princípios e a forma institucional de uma nova cultura política, de um novo regime de governo e um sistema eleitoral onde povo escolhe seu governo, inclusive o príncipe.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Crise na UnB dá oportunidade a ME recuperar papel social

Carlos Magno Spricigo Venerio é professor universitário.

Leio nos jornais de hoje (15/ABR) que os alunos da UnB não querem deixar a Reitoria da universidade, mesmo com a anunciada renúncia do Reitor, Timothy Mulholland. Estão a reivindicar mudanças importantes na estrutura das universidades brasileiras, como maior peso na escolha dos seus dirigentes, tema que tenho pretendido tratar aqui.

O caso Mulholland mostrou que os mecanismos do Estado de Direito não bastam para dar resolução social a casos de condutas equivocadas de homens públicos. O caso do Reitor da UnB estava sendo bem conduzido de acordo com as regras do Estado de Direito: sabe-se lá quando teríamos um posicionamento a respeito do uso indevido de recursos públicos para uso com evidente desvio de finalidade.

Veja bem, não é o caso de defendermos julgamentos sumários, sem chance de defesa por parte dos acusados. Os fatos noticiados, porém, falavam por si: mais de R$ 400.000,00 da FINATEC usados para decorar luxuosamente apartamento funcional do Reitor. Qual a defesa da Reitoria, num primeiro momento: não foram 450 mil, foram 350 mil reais, incluídas uma lixeira de quase mil reais. No mínimo, no mínimo, o princípio da moralidade aí estava (art. 37, CF) a exigir que o Reitor se afastasse do cargo para que as investigações pudessem correr sem maiores constrangimentos. Nada foi feito neste sentido.

Desta forma, não fosse a invasão/ocupação da Reitoria pelos estudantes, este seria mais um caso a deseducar a cidadania brasileira, pois a postura imperial do Reitor indicava a via do “não tenho mais contas a prestar neste caso”. É a democracia em seu sentido pleno, não apenas a democracia aprisionada pelos conceitos da ciência política, vista como mero meio de gestão governamental, mas sim como forma de sociedade (LEFORT) que vem trazer uma solução adequada para questão de importância simbólica para a educação brasileira.

Agora, ao não querer abandonar a trincheira, tentam aproveitar a vitória na batalha contra o Reitor para reerguer bandeiras históricas importantes do Movimento Estudantil. Mesmo, de longe, vendo algumas reivindicações cuja enunciação no estilo “só saímos daqui se...” soando simplistas, fico mais feliz que triste com este ressurgimento. Torço para que o ME consiga retomar um pouco do importante protagonismo de outras épocas. Sejam muito bem-vindos!

sexta-feira, 11 de abril de 2008

A Universidade no Século XXI

O sociólogo português Boaventura de Sousa Santos dedica, seguidamente, atenção aos problemas da universidade. Em 2004, esse professor na Universidade de Coimbra dedicou generosa e fecunda reflexão ao tema, agora sob os impactos da globalização. Convidado para participar dos debates sobre a reforma universitária, desfechada pelo governo Lula, suas análises viraram livro: “A universidade no século XXI” (SP, Cortez). É leitura oportuna e necessária, pois estimulante e desafiadora.

Em 1975, após o desabamento da ditadura fascista em Portugal, Boaventura de Sousa Santos publicara “Democratizar a universidade”. Trazia instigante análise dos malefícios que a instituição deveria exorcizar para assumir autênticas feições sociais, participando da fase institucional e política inaugurada no país. Extirpação do autoritarismo, da inércia econômica e do atraso cultural, reinante mesmo entre dirigentes universitários, e exercício da criatividade, da reflexão, do estudo dos problemas, novos e antigos, locais e mundiais.

Para entrar em sintonia com os anseios de uma sociedade carente e ávida por mudanças, a universidade portuguesa deveria promover a reforma e a autodepuração. Rever métodos de gestão administrativa e de ensino, promover o debate intelectual, a liberdade de cátedra e do pensamento crítico, a valorização do trabalho docente e das expectativas dos estudantes, para a consecução dos fins maiores da universidade. Afastar obstáculos que moldaram a universidade sob o obscurantismo, o mandonismo, a mediocridade e a burocratização, aportadas pelo regime ditatorial. Este vinco nefasto não deveria sobreviver sob o risco de perpetuar a hostilidade aos preceitos de uma sociedade democrática, do interesse público das ciências, da disseminação das liberdades historicamente sufocadas e do socialismo.

No século XXI, as dificuldades foram agravadas. A reforma universitária deve apontar para a democracia e a emancipação humana, anteparos à onda de devastação social erguida pelos ventos do neoliberalismo, do desemprego, da guerra, das múltiplas formas de discriminação e do livre comércio. A mercantilização do ensino constitui o mais feroz ataque aos campi universitários. A sangria de recursos da sociedade via mensalidade, subsídio do Estado e salários baixos, fornece a chave da universidade projetada pela e para a era neoliberal. Quanto maior “acesso”, maior a possibilidade dos lucros. Uma espécie de “abre-te sésamo!”.

Na contramão do neoliberalismo, maior aproximação entre universidade e escolas públicas, questionamento do mundo em constituição e interrogação sobre o futuro, mais porosidade para as necessidades sociais. Nova “centralidade às atividades de extensão” universitária, na busca de outras formas de globalização, sem exclusão social e degradação ambiental, e maior participação dos oprimidos. A reorientação da pesquisa, em direção às comunidades marginalizadas e aos problemas estruturais do país. Ações que conferem forte legitimidade social à universidade e capacidade para sobreviver ao surto de acumulação de capital nutrido pela comercialização da educação, da ciência e da cultura.

No Brasil, o salto terá que ser maior. Sequer foi rompida a situação herdada do regime militar, entranhada em mentes, instâncias e instituições das nossas universidades. Situação diagnosticada, já em 1981, pelo sociólogo Florestan Fernandes, onde “no terreno prático, nem sequer a carreira está prevalecendo, são interesses mesquinhos, de dominação, de destruição dos outros”, pois gerações formadas sob ditadura, muitas vezes, operam com métodos daquela. Imersa em condutas corporativas e ações autodestrutivas, a universidade volta suas costas para a realidade que a cerca e ao futuro que deveria projetar e construir.

A renovação da cultura universitária demandará redobrada energia e requer opções. É possível, e necessário, abrir perspectivas novas, enlaçar as universidades e seus recursos humanos mais grandiosos na cooperação intelectual e na solidariedade social. Desenhar um país e um mundo mais igualitário e justo, fazendo frente a comportamentos e a políticas hostis à cidadania, à felicidade e à integridade individual e coletiva. O professor Boaventura de Sousa Santos indica uma universidade que o século XXI deseja e merece.

Paulo Henrique Martinez
Professor e coordenador do Laboratório de História e Meio Ambiente no Departamento de História da UNESP/Assis (labhima@uol.com.br).

quarta-feira, 9 de abril de 2008

UM NOVO MODELO DE UNIVERSIDADE, UMA NOVA CULTURA POLÍTICA (Diálogo 1)

Tendo em vista uma contribuição para o aprofundamento do conceito de Universidade Comunitária, convido o leitor a viajar pelo tempo da História com o objetivo de estabelecer breves diálogos com autores e obras de épocas distintas. Como metodologia de reflexão, proponho-me a estabelecer um diálogo aberto com alguns dos clássicos do pensamento filosófico e político da cultura ocidental, restringindo a discussão em relação ao tema proposto (Cultura Política). Isso significa que será sempre um diálogo parcial, ou seja, um diálogo centrado em algumas das visões e idéias dos autores selecionados. Também não tenho a preocupação de assinalar algo novo em relação aos pensadores escolhidos, uma vez que não é esta a finalidade deste espaço de discussão.

Por se tratar de cultura política, inicio a discussão sobre uma das obras mais polêmicas da história do pensamento ocidental moderno: O Príncipe (1513). Maquiavel escreveu uma obra de “realismo político”; uma filosofia sobre a natureza humana, atitudes e posturas diante do jogo do poder, sobre a relação entre governante e povo.

Diferentemente de outros pensadores, Maquiavel não se propõe a pensar uma utopia. Ao contrário, se preocupa em explicitar sua visão sobre o “jogo do poder” tal como ele é, ou melhor, como ele o percebe. Seu objetivo é ensinar lições ao príncipe ou ao monarca, a arte de governar e se manter no poder. Para se manter no poder ou alcançá-lo, o príncipe sábio deve se mostrar um profundo conhecedor da realidade e da natureza humana.

Nos seus ensinamentos, Maquiavel ensina ao príncipe o que deve fazer para evitar ser odiado ou desprezado, pois isto certamente resultaria em sua ruína; destaca que “os homens costumam ser ingratos, volúveis, dissimulados, covardes e ambiciosos de dinheiro”; enquanto possuem privilégios demonstram certa lealdade, mas quando a relação é baseada em interesses mesquinhos não se pode contar com esse tipo de amigo nos momentos mais importantes. Numa época em que as cortes européias estavam repletas de “aduladores”, Maquiavel aconselha ao príncipe que uma das formas de se proteger dos aduladores era demonstrar respeito aos homens que lhe falavam a verdade, ou seja, o monarca deveria assegurar a liberdade de expressão ou de opinião aos seus ministros, ouvindo-lhes e decidindo conforme seu julgamento.

Apesar de oferecer seus ensinamentos aos governantes, aos poderosos, Maquiavel revela uma concepção de poder em que o povo aparece como ator social difícil de conquistar. O “poder” é uma força que se estabelece na relação entre governante e povo. À medida que se preocupa em ensinar ao príncipe atitudes e formas para conquistar e controlar o povo, ressaltando as dificuldades e os riscos da relação, Maquiavel mostra também a força do povo, que tem o poder de destituir o soberano quando este comete erros decorrentes de sua arrogância, imprudência ou ignorância. Nesta perspectiva, percebe-se que o povo também pode conquistar o poder.

Escrito no contexto da Itália do Renascimento, O Príncipe é considerado uma das obras que representa de forma singular o espírito renascentista. Tal como os humanistas de sua época, Maquiavel se distancia do pensamento teológico e centra seus estudos sobre a natureza humana, as virtudes e fraquezas do homem. O homem virtuoso não é mais aquele que cumpre os desígnio de Deus ou simplesmente segue os preceitos da vida religiosa ou espera as coisas acontecerem. Ao contrário, ele toma iniciativa, conhece a realidade, percebe a proximidade do mal ou da crise antes que ela se alastre, e age rapidamente cortando a mal pela raiz. A virtude é atribuída ao governante sábio, aquele que demonstra competência, que não se deixa ludibriar facilmente, que não se desespera perante uma crise e que acredita na sua própria força e capacidade; e que também tem consciência de que a sua permanência ou não no poder depende da relação que se estabelece com o povo.

Eis o primeiro diálogo. O próximo será um clássico da Inglaterra, contemporâneo de Maquiavel.

Carlos Renato Carola – 02/04/2008
E-mail: karlos.renato@yahoo.com.br

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Universidade Comunitária: educação superior e projeto de nação

Ilton Benoni da Silva
Professor Universitário

O Brasil tem uma história consolidada de experiência de educação superior empreendida por iniciativas comunitárias, isto é, por instituições públicas não estatais. Ao considerarmos essa história, podemos transcender os debates meramente abstratos para nos situarmos no terreno concreto dessa experiência. Isto é, a universidade comunitária não é uma idéia apenas, mas vem sendo produzida, como diria Karl Marx, na “síntese de múltiplas determinações” do contexto da sociedade brasileira. Sociedade marcadamente desigual, em que o estado jamais esteve a serviço do coletivo e, sim, funcionou sempre como uma espécie de “comitê” aglutinador dos interesses das elites econômicas e políticas. A educação superior, obviamente, é uma das manifestações desse amálgama social. Oferecida aos poucos “bem-nascidos”, concentrada em grandes centros e com ofertas de vagas muito aquém das aspirações das classes trabalhadoras, especialmente, àquelas sitiadas nos rincões interioranos.

No vácuo dessa (não) presença estatal, muitas comunidades, principalmente na região sul do país, assumiram para si a tarefa de produzir educação superior. Isto é, no interior do quadro dado pelos fatores objetivos atuam de forma determinante os sujeitos coletivos organizados, para dar novo contorno aos destinos de comunidades esquecidas. Importa ver a iniciativa comunitária, portanto, no interior de um determinado campo de luta, em que se confrontam visões de mundo e interesses divergentes de grupos, muitas vezes antagônicos. A educação produzida no âmbito das iniciativas comunitárias é contra-hegemônica desde a sua gênese, pois conflita com a posição hegemônica da elite brasileira de educação para poucos e em lugares privilegiados. Mas, de iniciativa periférica, a universidade comunitária, hoje, é alternativa concreta de fortalecimento de um projeto de nação. Quando, por imperativos do jogo político das sociedades do século XXI, já não se sustentam àquelas visões canhestras elitistas; quando se impõe a necessidade de um salto qualitativo dos processos educacionais; quando o Estado brasileiro evidencia limites profundos nas condições de financiamento de uma iniciativa educacional gigantesca e descentralizada; quando se revela toda a fragilidade e as distorções da alternativa fracassada de ampliação pelas regras tão-somente do mercado privado e privatista; quando todos essas determinações contrastam com a idéia de educação para uma sociedade emancipada e igualitária, a alternativa para um novo projeto de nação já está formatada, fora do Estado stricto sensu e à margem do controle imediato e completo do “modus vivendi” da elite nacional: educação superior comunitária, pública não-estatal.

Mais que uma alternativa organizacional, o COMUNITÁRIO é um modelo de processo pedagógico, portanto também político-cultural, de materialização de um projeto de sociedade. Sem ilusões de blindagem em relação às contradições sociais mais amplas, é possível reconhecer na experiência comunitária um acúmulo de conhecimento sobre práticas político-educacionais coletivizadas, portanto não personalizadas; descentralizadas, portanto na direção dos muitos e menos bem situados social, econômica, política e geograficamente; auto-gestionárias, com o protagonismo decisório de todos os envolvidos; universitárias, pois são instituições predominantemente de educação promovida pelo ensino, pela pesquisa e pela extensão; em síntese, com forte articulação com as comunidades que as criam, demandam e sustentam.

segunda-feira, 31 de março de 2008

Pesquisa

Lédio Rosa de Andrade
Doutor em Direito e Psicanálise pela Universidade de Barcelona
Desembargador (TJSC)

Entre um grande número de teorias sobre o conceito e funções da universidade, prepondera a que aponta o ensino, a pesquisa e a extensão como seus pilares básicos. Mas isso não é pacífico. Existem, inclusive, aqueles que combatem a compreensão em separado das funções, afirmando não haver ensino sem pesquisa, e vice-versa. O certo é que se pode construir muitas teorias, e que toda classificação é sempre duvidosa. Mas, para facilitar, parece-me interessante ver o ensino como a transmissão do conhecimento já existente; a pesquisa como a produção do conhecimento novo; e a extensão como a aproximação da academia com a população.

E, entre essas funções universitárias, a pesquisa se destaca como a mais difícil, mas, ao mesmo tempo, a mais importante, pois responsável direta pela evolução da própria humanidade. Cada pesquisa feita é um passo a mais no progresso de nossa espécie. É corolário de pesquisas que a vida média do ser humano pulou de 26 anos no paleolítico superior, para em torno de 75, no atual momento histórico. Mas as bombas atômicas e outras também dela surgiram.

Entre prós e contras, a pesquisa experimental é a base da ciência, e é esta quem determina o conceito de verdade. Essa função, outrora, era monopólio dos religiosos, mas, a partir do positivismo científico, passou às mãos dos cientistas, para o bem de toda a humanidade. E isto se funda em uma questão epistemológica. Antes, a verdade era uma questão de crença. Os membros da igreja afirmavam que algo era verdade, porque deus disse. E todos acreditavam. Entretanto, com a preponderância da ciência, afastou-se a crença e, em seu lugar, veio a experimentação, ou seja, quando um cientista ou qualquer outra pessoa afirma que algo é verdade, imediatamente vem a assertiva: então demonstre.

A demonstração é a essência da pesquisa. Em palavras bem simples, a base da experimentação pode assim ser entendida: parte-se de uma hipótese ou uma afirmação provisória, como por exemplo, “Se soltar-se um corpo sólido no ar, ele cai. Há uma força na natureza que atrai os corpos sólidos para o solo.” Para provar isso, o pesquisador utiliza vários tipos de corpos sólidos, em vários ambientes, sem qualquer interferência (controle das variáveis) e, em todas as vezes, eles caem. Portanto, fica experimentalmente comprovado que, de fato, os corpos caem. A isso também se chama experiência empírica, pois efetuada a partir da observação da realidade. Com essa prova, a hipótese vira uma Lei (até que seja demonstrado o contrário), à qual se dá um nome: no caso, Lei da Gravidade.

Agora digamos que um religioso ou místico afirme que tem poderes de erguer corpos sólidos e de curar pessoas. Antes, bastava acreditar, agora tem de provar. E, para provar, ele tem de ir a um ambiente neutro, com controle de todas as possibilidades de interferência, como um laboratório de física de uma universidade. E, ali, observado por cientistas, deverá erguer os corpos e curar as pessoas. Se não fizer isso, repetitivamente, sua hipótese não se torna Lei, e ele passa a ser considerado um mentiroso. Esse é o grande avanço da ciência: exigir demonstração. E é por isso que todos os milagres são feitos fora dos laboratórios.

A pesquisa torna-se mais complexa nas ciências sociais, pois, nessa área do conhecimento, nem sempre é possível uma demonstração empírica clara, através da experimentação. Mas, mesmo diante dessa e de outras dificuldades, a interferência da ideologia e do inconsciente na prática do investigador entre elas, trata-se do caminho mais confiável para se estabelecerem verdades, sempre provisórias.

Por isso, os países desenvolvidos possuem grandes universidades, todas produzindo pesquisas de qualidade. Em nossa terra, com ar de sabedoria, para não dizer de ufanismo, há quem pense ser função da universidade movimentar o mercado local. Constrangedor, para todos.

sábado, 8 de março de 2008

Universidade Comunitária e gestão democrática – Parte I

Prof. Carlos Magno Spricigo Venerio

Um viés relevante para a análise das potencialidades das universidades comunitárias é a gestão, mormente a verificação de quais os níveis de democratização a que podem ser submetidas estas Instituições.

A pertinência do tema ganha destaque até mesmo pela estipulação normativa, posto que Constituição Federal e Lei de Diretrizes e Bases da Educação cuidam do tema. Vejamos:

“Art. 206 – O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

VI – gestão democrática do ensino público, na forma da lei;” (CRFB/1988)

…“Art. 56. As instituições públicas de educação superior obedecerão ao princípio da gestão democrática, assegurada a existência de órgãos colegiados deliberativos, de que participarão os segmentos da comunidade institucional, local e regional.

Parágrafo único. Em qualquer caso, os docentes ocuparão setenta por cento dos assentos em cada órgão colegiado e comissão, inclusive nos que tratarem da elaboração e modificações estatutárias e regimentais, bem como da escolha de dirigentes.” (LDB, Lei 9.394/96)

A LDB evidencia o fato de que o princípio informador da organização chamada Universidade não é o mesmo princípio informador da Democracia, ao dar aos professores setenta por cento dos assentos nos diversos órgãos colegiados de uma instituição. Sobram trinta por cento para alunos e funcionários.

Cada organização social possui um princípio informador, que a diferencia e identifica. De fato, assim como o Exército apresenta a hierarquia como seu princípio basilar, a Universidade como organização nos traz a noção de mérito, onde os membros da comunidade universitária (docentes, discentes e funcionários) desempenham distintas funções dentro da organização. Os professores são os elementos centrais no desenvolvimento das funções básicas de uma universidade: ensino/aprendizagem, pesquisa e extensão.

A Democracia opera com princípios não opostos, mas diversos. Os gregos desenvolveram a democracia como uma forma de organização social onde devem estar presentes a isonomia e a isegoría, respectivamente, igualdade diante da lei e liberdade de poder defender suas idéias no espaço público. Enquanto a democracia opera sob o princípio da autonomia (já que a realidade do poder é inafastável, sou livre quando participo do processo de elaboração das normas a que serei submetido) a universidade opera sob o princípio da meritocracia. Enquanto numa a igualdade é pressuposto, na outra o que se vê é uma diferenciação funcional explícita, onde o papel protagônico na atividade-fim é reservado a um grupo específico, os docentes.

É possível conciliar os dois princípios? É possível aprofundar a experiência democrática na gestão universitária sem ferir o mérito e o que deveria ser a sua conseqüência, a excelência acadêmica? Ao fundo desta questão vemos o velho debate sobre os componentes de uma decisão: técnica (deixemos para os especialistas) ou política? Aqui fico com o velho KELSEN, que travou debate semelhante com os fascistas, quando estes defendiam substituir os parlamentos liberais por colegiados pretensamente técnicos: não existe decisão puramente técnica, há sempre um elemento volitivo (e, portanto valorativo) em cada decisão.

É possível enfrentar este debate de duas formas. Em abstrato, por meio da especulação filosófica, ou analisando experiências existentes de gestão onde se tenha caminhado de forma divergente dos estreitos limites estabelecidos para as IES públicas. Num próximo tópico, pretendo analisar a experiência de duas Universidades Comunitárias de Santa Catarina, onde a escolha de parte dos dirigentes se faz por meio do voto direto e universal.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Universidade ou Pseudo-Universidade Comunitária? - Parte I

Ivans Berzins

Eu gostaria de iniciar essa reflexão agradecendo o convite para participar desse blog e assim do debate sobre a Universidade Comunitária. Antes de se poder iniciar o debate propriamente dito sobre a Universidade comunitária, é necessário se fazer uma breve analise sobre o papel do ensino nos dias de hoje. Desde os anos 1990, o mundo vem experimentando um processe de transformação nas mais variadas esferas, sendo a lógica do capitalismo financeirizado seu motor, o rápido desenvolvimento tecnológico sua característica, e o pós-modernismo sua lógica cultural. Isso afetou o ensino superior enormemente, a partir do momento que transformou as relações do mundo do trabalho. Mais especificamente, nos últimos anos o ensino superior vem passando por um processo de mercantilização que transforma a forma pela qual a Universidade se relaciona com a sociedade. Assim dois aspectos têm que ser contemplados. O primeiro pelo lado do aluno; o segundo pelo lado da universidade.

Pelo lado do aluno, o primeiro ponto a ser discutido mais profundamente são as mudanças no mundo do trabalho. Com o processo de desenvolvimento tecnológico, há uma intensificação nos ganhos de produtividade em todos os setores, resultando no desaparecimento de postos de trabalho nos setores intensivos de mão-de-obra onde, normalmente, não é necessária uma formação intelectual mais refinada. Isso resulta a) na diminuição no nível de salário real nesses setores e b) no diploma universitário passar a significar a materialização da utopia de um mundo melhor, a partir do momento que se transforma em uma espécie de passaporte para a empregabilidade. Isso altera o perfil do aluno que procura a universidade.

Por mais que exista dentro da retórica da Economia Política crítica a questão da luta de classes, da conscientização da classe trabalhadora como instrumento revolucionário contra o Capital, retórica esta que se propagou para outras disciplinas, esse discurso nos dias de hoje se esvaziou, através da vitória do pós-modernismo e do individualismo. O resultado é que não há mais consciência de classe, pois há uma vasta gama de tecidos sociais se reproduzindo através de paradigmas e relações sociais diferenciadas em um mesmo espaço geográfico. Desta forma, as pessoas não querem se emancipar do Capital, mas simplesmente querem ter a possibilidade de se submeterem. A oferta de trabalhadores passa a ser maior do que a demanda, aumentando o exército de reserva. Isso faz com que as exigências dos empregadores passem a ser cada vez mais complexas e que as pessoas tenham que possuir uma grande capacidade de adaptação: Ensino médio para ser varredor de rua; biólogo para conseguir um emprego de tratador de animais no zoológico (esse caso ocorreu em São Carlos-SP, em um concurso do Horto Florestal). Sem falar nas línguas estrangeiras. O fato é que um grande contingente de pessoas que simplesmente gostariam de realizar o sonho de ter um emprego mediano com uma remuneração digna passa a ter que procurar a universidade para obter o passaporte da empregabilidade. Pessoas que não querem adquirir grandes conhecimentos, mas apenas ter um diploma para garantir uma vida digna.

Pelo lado da universidade, em seu sentido clássico, ela é uma parte essencial da civilização ao determinar o que há de mais avançado em termos de educação ao promover a busca por novos conhecimentos e influenciar os paradigmas de civilidade na vida quotidiana. Em outras palavras, a função da universidade é criar e difundir conhecimento. No primeiro está contemplada a pesquisa e o ensino, no segundo a extensão. Contudo, como conseqüência das mudanças sociais, econômicas e culturais dos últimos tempos, atualmente há, basicamente, dois tipos de universidade: uma que se encaixa no conceito clássico (por exemplo, USP, UNICAMP, UNESP, UFRJ, UFSC, UFRGS, entre outras) e as outras que são pseudo-universidades, pois explicitamente são instituições apenas produzindo mão-de-obra qualificada, muitas vezes, desqualificada. Essas últimas nivelam seu nível para baixo para conseguir alunos e assim poder se financiar, arrepiando a qualidade de ensino, negligenciando a pesquisa e apenas fazendo extensão se há lucro. Usam a retórica da excelência em ensino e pesquisa, pregam a extensão como princípio fundamental mas, na prática, praticam um estelionato social. Que tipo de universidade a Universidade Comunitária deve ser, é uma pergunta muito importante, que o texto do Miranda (abaixo) dá indicativos de possíveis respostas. Voltarei ao tema em breve.

Ivan Bérzin

A Universidade Comunitária e o mercado

Antônio Luiz Miranda

Professor da UNESC

Universidades comunitárias são instituições de nível superior sem fins lucrativos e que se dedicam ao ensino, pesquisa e extensão. Normalmente estão registradas como entidades públicas de direito privado.

Este híbrido de público e privado parece ser um complicador para identificar este tipo de instituição. É uma instituição pública ou privada? Se pública, cabe ao Estado gerir e manter; se privada, deve ficar a mercê das perversas leis do mercado.

Percebe-se que para o setor público uma universidade é pública ou privada, de forma que a maioria projetos governamentais para o ensino superior trabalham com essa dicotomia, não reconhecendo o diferencial das comunitárias.

Por outro lado, uma boa parte das universidades comunitárias comportam-se como se fossem privadas, mobilizam suas energias na pura e simples busca do lucro. Recorrem ao Estado apenas quando se encontram em dificuldades financeiras.

Não existe ainda uma legislação acabada sobre este tipo de instituição que a caracterize objetivamente e estabeleça regras claras sobre seus direitos e deveres.

Um exemplo desse tipo de instituição ocorre em Santa Catarina. O sistema “Acafe” congrega hoje várias universidades comunitárias espalhadas no território catarinense. A origem dessas universidades se deu no final da década de sessenta, a partir de uma política do governo estadual de incentivar a criação de cursos de nível superior em todo o estado.

Foram criadas, na época, as fundações universitárias, com a participação dos municípios e governo estadual, ficando estes, responsáveis pela manutenção de uma parte dessas novas instituições, sendo que a maior parcela ficaria por conta dos futuros alunos. Ou seja, a mensalidade paga pelos alunos tornou-se a fonte principal para manutenção das fundações. Esse modelo permanece até os dias atuais.

A implementação das fundações universitárias foi importante para a expansão do ensino superior no estado de Santa Catarina sem a necessidade de empregar grandes somas de recursos públicos. Por outro lado, grande parte dessas instituições ficaram dominadas por oligarquias locais, que se utilizam dessas como forma de garantir o poder político e econômico regional.

Nas décadas de oitenta e noventa, grande parte dessas fundações transformaram as faculdades em universidades regionais comunitárias. Aproveitando-se do momento de liberalização geral da economia, da desregulantação do Estado, principalmente durante o governo de FHC, essas universidades entraram definitivamente na disputa mercadológica do ensino superior em Santa Catarina.

Abriram novos cursos, construíram campus fora de sua região de origem, gerando uma competição entre instituições que, a princípio, eram sócias no chamado sistema Acafe. Porém, instituições privadas estão avançando nesse mercado, ofertando ensino superior a um custo bem abaixo do cobrado pelas comunitárias do sistema Acafe, gerando uma concorrência nunca antes vista.

Na lógica do livre mercado, a demanda de alunos para os cursos das comunitárias tem baixado consideravelmente, indicando que essas não estão conseguindo vencer a concorrência com as instituições privadas.

A crise nas comunitárias está anunciada. Por um lado, não estão conseguindo competir com as instituições privadas, perdendo para essas uma grande parcela de alunos. Por outro, o Governo Federal tem promovido, nos últimos anos, a expansão do ensino superior público e gratuito, com a criação dos CEFETs que estão sendo transformados em institutos de ensino superior a extensão da Ufsc para o interior do estado onde as comunitárias já estão instaladas.

As universidades comunitárias de Santa Catarina ao optarem pela competição mercadológica, utilizando campanhas de markentig extremamente agressivas, perderam credibilidade na sociedade catarinense.

Seus dirigentes têm promovido mudanças internas, como reformas administrativas, demissões de professores (principalmente doutores) e funcionários, corte de recursos para pesquisa e extensão, sempre no sentido de baixar custos e continuar competitiva no mercado, porém isso está gerando um mal estar muito grande entre os profissionais que atuam nessas instituições.

Um grande impasse está colocado na sobrevivência do sistema comunitário de ensino superior catarinense. O que fazer? Como manter a estrutura construída durante o período de expansão? É possível sobreviver ao avanço o setor privado?

Essas, entre muitas outras questões, tem preocupado a todos que de uma forma ou outra mantém vínculos com as instituições comunitárias. Nesse sentido, torna-se importante estabelecer um grande debate sobre esse patrimônio da sociedade catarinense, buscando a democratização do sistema, maior publicização e acessibilidade para a maioria da população.

Pesquisa e Universidade: Duas faces da mesma moeda

Sergio Graziano
Professor da Unesc
Doutor em Direito pela PUC/RJ

Em sentido amplo, não há universidade sem pesquisa e a seu turno a pesquisa encontra na universidade seu locus privilegiado. Portanto, a idéia de pensar pesquisa é originária da necessidade de recuperar uma reflexão mais adequada e, na verdade, expor de forma mais efetiva sua função nas universidades. Nosso compromisso, enquanto professores universitários, é proporcionar uma gestão de pesquisa que cumpra, ao menos, uma adequada e qualificada formação dos discentes, constituindo-se no melhor espaço à produção do conhecimento.

Juntamente com o ensino e a extensão, atividades tipicamente das universidades, a pesquisa exerce função reparadora e de consolidação nas universidades. Ela exerce função reparadora quando permite a constituição de novos e diferentes conhecimentos e exerce a função de consolidação quando reafirma que a própria universidade é o local de discussão, produção e divulgação do conhecimento.

Do ponto de vista interno das universidades, entendo que este é o momento mais adequado para uma redefinição das políticas institucionais sobre a pesquisa, inclusão social e democratização dos espaços acadêmicos na tentativa de entender as contemporâneas crises sociais, políticas e econômicas. Em rápidas e mal traçadas linhas esta é minha contribuição à presente discussão.

sábado, 1 de março de 2008

O paradoxo cartesiano da Universidade: ensino, pesquisa e extensão. (Parte I)

Vladimir de Carvalho Luz
Professor da Unesc

Dividir para explicar a complexidade. Tomo emprestado essa máxima cartesiana, não para pensar questões estritamente epistemológicas, mas como simples pretexto para provocar um olhar “desconfiado” sobre um tema pontual, especificamente sobre o tão falado e difundido “tripé” indissolúvel das funções universitárias. Sobre essa temática, “lugar-comum”, proponho as seguintes provocações: a questão da indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão, mesmo tendo sido erigida, no Brasil, ao status de norma constitucional, não se reveste, concretamente, em mero apelo retórico? As práticas majoritárias e reais, na universidade, grosso modo, contemplam essa diretiva da unidade indissolúvel entre ensino, pesquisa e extensão ?

Parece não haver dúvidas de que uma instituição universitária, por força até do prescreve disposição expressa da Constituição vigente (caput do art. 207), deve (atenção: deve) realizar, de maneira indissociável, as atividade de ensino, pesquisa e extensão. Não se trata apenas de uma questão legal, normativa. Parece, também, haver certo consenso (ao menos simbólico) dos experts no mundo acadêmico de que tal indissociabilidade é, em tese, o que qualifica o mandato do ensino superior. O problema está em saber se essa aparente unanimidade acerca da indissociabilidade é, de fato, um elemento real e visível da vida cotidiana das universidades.

Imaginando-se que, de modo geral, o modelo operativo das universidades brasileiras é baseado em currículos fechados, numa lógica disciplinar, na primazia do ensino, bem como em estruturas de gestão compartimentadas, seria, então, possível efetivar, como fato comum, real, visível e paradigmático essa unidade orgânica entre pesquisa, ensino e extensão?

Eis o paradoxo cartesiano da universidade brasileira: por um lado, nasce marcada pelo mandato existencial da indissociablidade de funções, o qual é aceito por muitos, sendo até erigido a norma constitucional. Mas, no campo das práticas efetivas, o princípio ou máxima da indissociabildade se vê refém de uma estrutura universitária que majoritariamente produz ações autônomas, estanques, raramente interligadas, numa lógica do fracionamento do mandato geral da universidade. Para não simplificar ao extremo o tema, seria justo ir muito além, para saber o alcance do sentido do termo “indissociabilidade”: se, por exemplo, existiriam graus de unidade mínima entre ensino, pesquisa e extensão. Aqui, no entanto, trata-se apenas de uma provocação preliminar.

Um alento final: os paradoxos, dizem os sistêmicos e não os cartesianos de carteirinha, não são problemas para vida social. Eles, os paradoxos, constituem a nossa própria condição de existência. Será?

Apresentação

Somos um grupo plural que busca fomentar o debate sobre a experiência da educação superior em geral e a Universidade Comunitária em especial.
A Universidade Comunitária, em rápida pincelada, é a entidade pública não-estatal que se dedica ao ensino/aprendizagem, pesquisa e extensão.