sexta-feira, 4 de abril de 2008

Universidade Comunitária: educação superior e projeto de nação

Ilton Benoni da Silva
Professor Universitário

O Brasil tem uma história consolidada de experiência de educação superior empreendida por iniciativas comunitárias, isto é, por instituições públicas não estatais. Ao considerarmos essa história, podemos transcender os debates meramente abstratos para nos situarmos no terreno concreto dessa experiência. Isto é, a universidade comunitária não é uma idéia apenas, mas vem sendo produzida, como diria Karl Marx, na “síntese de múltiplas determinações” do contexto da sociedade brasileira. Sociedade marcadamente desigual, em que o estado jamais esteve a serviço do coletivo e, sim, funcionou sempre como uma espécie de “comitê” aglutinador dos interesses das elites econômicas e políticas. A educação superior, obviamente, é uma das manifestações desse amálgama social. Oferecida aos poucos “bem-nascidos”, concentrada em grandes centros e com ofertas de vagas muito aquém das aspirações das classes trabalhadoras, especialmente, àquelas sitiadas nos rincões interioranos.

No vácuo dessa (não) presença estatal, muitas comunidades, principalmente na região sul do país, assumiram para si a tarefa de produzir educação superior. Isto é, no interior do quadro dado pelos fatores objetivos atuam de forma determinante os sujeitos coletivos organizados, para dar novo contorno aos destinos de comunidades esquecidas. Importa ver a iniciativa comunitária, portanto, no interior de um determinado campo de luta, em que se confrontam visões de mundo e interesses divergentes de grupos, muitas vezes antagônicos. A educação produzida no âmbito das iniciativas comunitárias é contra-hegemônica desde a sua gênese, pois conflita com a posição hegemônica da elite brasileira de educação para poucos e em lugares privilegiados. Mas, de iniciativa periférica, a universidade comunitária, hoje, é alternativa concreta de fortalecimento de um projeto de nação. Quando, por imperativos do jogo político das sociedades do século XXI, já não se sustentam àquelas visões canhestras elitistas; quando se impõe a necessidade de um salto qualitativo dos processos educacionais; quando o Estado brasileiro evidencia limites profundos nas condições de financiamento de uma iniciativa educacional gigantesca e descentralizada; quando se revela toda a fragilidade e as distorções da alternativa fracassada de ampliação pelas regras tão-somente do mercado privado e privatista; quando todos essas determinações contrastam com a idéia de educação para uma sociedade emancipada e igualitária, a alternativa para um novo projeto de nação já está formatada, fora do Estado stricto sensu e à margem do controle imediato e completo do “modus vivendi” da elite nacional: educação superior comunitária, pública não-estatal.

Mais que uma alternativa organizacional, o COMUNITÁRIO é um modelo de processo pedagógico, portanto também político-cultural, de materialização de um projeto de sociedade. Sem ilusões de blindagem em relação às contradições sociais mais amplas, é possível reconhecer na experiência comunitária um acúmulo de conhecimento sobre práticas político-educacionais coletivizadas, portanto não personalizadas; descentralizadas, portanto na direção dos muitos e menos bem situados social, econômica, política e geograficamente; auto-gestionárias, com o protagonismo decisório de todos os envolvidos; universitárias, pois são instituições predominantemente de educação promovida pelo ensino, pela pesquisa e pela extensão; em síntese, com forte articulação com as comunidades que as criam, demandam e sustentam.

1 comentários:

Unknown disse...

Ótima iniciativa. Qualquer Universidade merece discusões deste nível. E a Unesc, que amamos tanto, esta sendo agraciada com este blog. Faremos tudo que for possível pelo crescimento deste. Abraços!