segunda-feira, 23 de junho de 2008

A universidade comunitária diante das questões ambientais

Mauricio Ruiz Câmara
Professor na UNESC
Falar do papel da universidade comunitária diante das questões ambientais pressupõe contextualizar e compreender a crise ambiental enquanto processo engendrado pela relação da sociedade com a natureza e compreender no cenário mundial o capitalismo e a busca contínua da produção de mercadorias, que tem suas bases no conhecimento técnico-científico-informacional e nas novas formas flexíveis de produção e acumulação, bem como situar historicamente a universidade, pois corremos o risco de reproduzir os discursos que ensinam que o caminho das instituições de ensino superior é vender serviços e tecnologias ambientais sem questionar sua responsabilidade e os interesses que estão colocados em questão. Antônio Carlos Robert Moraes, na obra “Meio ambiente e ciências humanas”, me auxilia na análise.
Até o século XIX, a riqueza das nações se dava pela exploração das colônias; no século XX a riqueza no capitalismo monopolista ocorre pela exploração dos países em desenvolvimento; no século XXI, no capitalismo globalizado, há uma corrida pela apropriação da biodiversidade humana, das florestas e da fauna (genética e laboratórios), culminando nas patentes e desenvolvimento de novos medicamentos e tecnologias. Aliam-se a este quadro a crise das matrizes de energia, notadamente o petróleo, a crise da água (acesso e disponibilidade natural) e o contexto de guerras e conflitos vividos atualmente no mundo.
Estes movimentos ampliam as desigualdades e contradições no mundo e ganham contornos específicos no Brasil, que foi colônia de exploração, gestou uma sociedade escravocrata e foi palco de sucessivas ditaduras, que em diferentes momentos imprimiram uma visão de desenvolvimento a qualquer preço e de acordo com as conveniências e interesses cartoriais, e que atualmente tem no neoliberalismo, um movimento que solapa a base social e pública do seu patrimônio ambiental (floresta, rios e mar – biodiversidade).
Na atualidade, o país experimenta um movimento gigante de expansão das fronteiras agrícolas no Cerrado e na Amazônia (monocultura, Blairo Maggi), bem como um crescimento acelerado, desordenado e violento das cidades (crise urbana). Na região sul catarinense, duas questões estão na pauta ambiental: o retorno, de forma incisiva e truculenta, da exploração e beneficiamento do carvão e a expansão da agricultura do arroz, contaminando com metais pesados e agrotóxicos praticamente toda a extensão sul do estado, incluindo atmosfera, solo, subsolo, rios e lagoas.
As resistências aos processos excludentes ocorrem por todo o país, realizada por indígenas, povos ribeirinhos, trabalhadores sem terra, trabalhadores sem teto e pelo movimento ambiental e outros setores menos organizados. Porém, pela escala e dimensão dos problemas, a resistência torna-se insuficiente para mobilizar e despertar a consciência social na sua totalidade.
Neste contexto, observamos de um lado o capital buscando sua realização e reprodução ampliada e de outro o movimento social fazendo resistência e propondo alternativas concretas para a transformação social. Neste movimento contraditório entra a universidade comunitária.
A universidade não é o principal agente dos embates, ela realiza leituras do contexto mais amplo e interage com os segmentos sociais. Porém, a contradição da sociedade é a contradição interna da universidade. Desta forma, a universidade incorpora as contradições da sociedade, pois trabalha com uma diversidade de agentes e profissionais em seus quadros e diferentes interesses estão postos. E o que norteia a ação de uma universidade notadamente comunitária?
Se a universidade reproduz a sociedade a contradição não se resolve, pois está incorporada a contradição. Assim, não é o principal sujeito da transformação social e sequer da degradação ambiental, e o conhecimento (re)produzido não é um saber que se coloca acima da sociedade, pois as decisões fluem por canais próprios do movimento social.
A universidade comunitária deve estabelecer uma interface com a sociedade, e neste contexto o cientista aparece com um cidadão, colocando o saber técnico a serviço da sociedade civil. Neste movimento, a universidade reforça a relação com a sociedade que a mantém.
Uma postura prudente é manter eqüidistância com governos, porém, manter interlocução com órgãos públicos, sendo o lócus permanente de avaliação e crítica das políticas públicas.
A universidade comunitária deve primar por uma postura ética nos trabalhos científicos que realiza, acentuando uma formação crítica em todas as especialidades, não se baseando numa racionalidade técnica instrumental.
A universidade comunitária tem relevante papel social, mas não é neutra e deve avaliar a todo o momento a favor de quê e a favor de quem está a serviço. Não pode perder o foco educativo em suas atividades, pois esta é sua possibilidade de intervenção social.
Uma universidade comunitária não pode se subordinar às empresas e interesses na execução de trabalhos ambientais, pois coloca em riscos sua credibilidade e dá margem para legítimos questionamentos e críticas.
Finalmente, a universidade comunitária deve manter constante avaliação da sua atuação social, desenvolvendo internamente mecanismos de auto-avaliação da aplicação da sua política ambiental, base para sua atuação na sociedade.

UNIVERSIDADE E DESENVOLVIMENTO: Uma abordagem sociológica, segundo Florestan Fernandes. (Parte I)

Antonio Luiz Miranda
Historiador
Florestan Fernandes (1920-1995) é considerado uma das grandes figuras da sociologia crítica do Brasil. Um tema marcante de sua vasta obra foi o debate em torno do papel da universidade na sociedade brasileira.
Neste espaço, pretendo comentar um texto do autor que trata do tema e que foi, a princípio, uma palestra proferida em 1968 aos alunos da Faculdade de Direito da USP, a convite do Centro Acadêmico XI de Agosto, mesmo com a proibição do diretor da Faculdade na época.
Universidade e desenvolvimento foi um dos aspectos discutidos por Florestan Fernandes na ocasião. Partia da idéia que a universidade pode ou não contribuir para o desenvolvimento e como o desenvolvimento contribui para modificar a universidade.
Na perspectiva sociológica, Fernandes utilizou o conceito durkeiminiano que entende que “as instituições compõe ou formam a sociedade”, mas é a sociedade que determina as instituições. Com isso, o autor critica a idéia, que para ele são de “senso comum”, que entendem as instituições como sendo auto-suficientes e se determinam por si mesma. Isto é, “bastaria uma boa organização e uma boa direção, para se ter um bom rendimento ou um rendimento ótimo”.
Na condição de sociólogo Florestan Fernandes estudou a universidade brasileira a partir da análise da realidade histórico-social. Afirma que a universidade brasileira tem raízes no modelo europeu e só chegou ao Brasil com a vinda da família real portuguesa e instalação da corte no Rio de Janeiro.
Porém, dada a estrutura senhorial-escravista da sociedade brasileira da época, o modelo ao ser “transplantado” para o Brasil, sofreu 3 tipos de empobrecimento:
Primeiro: o que se instalou no Brasil não foi universidade, mas faculdades e escolas superiores, inspiradas numa política educacional “estreita e imediatista”, influenciada pelas elites locais.
Segundo: para Florestan Fernandes, apesar de todas as condições adversas, a universidade portuguesa, até certo ponto, “preenchia as funções de investigar e produzir conhecimento”. No Brasil, no entanto, prevaleceu o modelo dependente. O exemplo pode ser visto no Direito, que mesmo após a independência não rompeu com direito português herdados da era colonial.
Terceiro: Trata do drástico empobrecimento funcional dos modelos importados, a escola superior serviu apenas para conferir diplomas para o exercício das profissões liberais como, a advocacia, a medicina e a engenharia, mas a formação mesmo, se dava na vida prática, dada a deficiência dos cursos.
Estes elementos representam, de forma resumida, como historicamente o ensino superior chegou e se implantou no Brasil. É interessante observar que muitas instituições de ensino superior atualmente mantêm a lógica de se prestar apenas a emitir diplomas e buscar lucro.
As análises de Florestan Fernandes aprofundam mais detalhes fundamentais do modelo de universidade brasileira, os quais serão abordados na segunda parte.

Ex-reitor diz que Gieduc é pioneiro na retomada do debate sobre tema no país

"Individualmente vivemos um tempo menor que o necessário para experimentar as mudanças. Perdemos nossa capacidade de transcender, de se tornar humano, de olhar para além de si mesmo, porque o egoísmo e o individualismo dominam as relações atuais. Este encontro me deixa muito feliz porque vem na direção contrária a tudo isso. Ao promover este encontro, vocês estão sendo pioneiros capazes de retomar os caminhos da humanidade, porque estão resgatando esta transcendência e a caminhada pela inclusão dos jovens na universidade. O Gieduc é pilar mestre da retomada da briga pela universidade comunitária neste país." A afirmação foi feita esta manhã (21) no auditório Ruy Hülse pelo ex-reitor da Unijuí, professor doutor Walter Franz. Considerado uma das maiores autoridades científicas do país nas pesquisas sobre Comunitarismo, ele esteve na Unesc à convite do Grupo Interdisciplinar de Estudos e Debates sobre Universidade Comunitária (GIEDUC) abrindo o Ciclo de Debates. A atividade foi coordenada pelos professores doutores Ilton Benoni e Sérgio Graziano. Também foi lançado o blog da Universidade Comunitária, que poderá ser acessado pelo endereço universidadecomunitaria.blogspot.com. ConcepçõesO ex-reitor iniciou sua fala lembrando que as concepções de universidade comunitária são concepções históricas e, como tais, são resultado da política, da economia, da cultura e da sociedade e que, infelizmente, perdeu-se muito desta característica. "Os bancos, o agronegócio, brigam e ganham. E nós, das comunitárias, não fazemos isso, esquecemos. Vale a pena brigar, sim", disse. Para o professor, a universidade é um lugar muito especial, uma ponte entre o universal e o particular, entre o global e o local, lugar do debate, lugar aberto para engajar-se, onde as pessoas devem ir para falarem, para debaterem seus problemas, suas necessidades. Também é o lugar de formação e qualificação, onde o ser humano possa capacitar-se. Lugar que deve se relacionar com o mercado e os governos, mas que deve ir muito além disso, porque cabe a ela interpretar o mundo. "Formar bons médicos, administradores, engenheiros faz parte do seu papel, mas sua função não é só isso e não pode se resumir nisso", falou. "A universidade é o lugar da liberdade, inclusive para respeitar a liberdade do outro". Novo modeloO palestrante falou que na prática da organização e do funcionamento do ensino superior brasileiro, se constata a existência e a construção de um novo modelo de universidade. Nesse novo modelo, o termo comunitário aparece como a idéia força que agrega para a viabilidade de um projeto comum. Comunitário, segundo ele, dá a entender muita coisa, a começar a partir de onde ele se situa, da universidade ou da fundação mantenedora da mesma. A imprecisão conceitual, por outro lado, diz o pesquisador, diminue quando se materializa em ações sociais, desperta identidade, mobiliza intenções e ações. Universidade comunitária, para Franz, deve ser entendida como parte da construção e ampliação dos espaços da esfera pública-não estatal nos quais os deveres e os direitos da educação são discutidos e construídos. "A universidade não é um supermercado", advertiu. "Precisamos organizar esses espaços, mobilizar-se frente ao Estado, para que ele tenha maior compromisso com este espaço, que canalize mais recursos onde está a maioria dos nossos jovens."Frases - Cerca de 20% da humanidade cabe no modelo econômico e político atual e 80% está excluída. Não gostaria de passar por aqui sem falar da minha indignação sobre isso. - A humanidade precisa ser reorientada para o comunitarismo. Autores dizem que precisaremos de 150 anos para isso. Sou mais otimista, e acredito em menos tempo.- O conteúdo ideológico é tanto maior quanto menor for a abertura do projeto em direção à participação da sociedade civil. - O novo modelo não nasce do núcleo do poder público-estatal, mas na sua periferia, muito mais como expressão de vozes populares, da ausência do Estado, do que da liberdade constitucional ou da possibilidade legal existente em favor da iniciativa privada no campo da educação. - Sua construção (do novo modelo) atua como processo pedagógico de educação e capacitação política de seus integrantes.- Das mais de 2.200 instituições de ensino superior existentes no Brasil, menos de 170 são universidades. Dessas, menos de 10% são universidades comunitárias.- Santa Catarina tem 10 universidades comunitárias e o Rio Grande do Sul tem oito. Juntas, somos mais de 10% das universidades brasileiras.
Jornalista Responsável: Janete Triches

Matéria completa, com fotos: http://www.unesc.net/noticias/index.php?id=3609

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Ata de constituição do GIEDUC

Ata de constituição do GIEDUC

Aos quatro dias do mês de junho do ano de dois mil e oito, sede da APROFUCRI, na cidade de Criciúma, às 22h e 30 min, reuniram-se as pessoas ao final assinadas, oportunidade em que foi discutida e deliberada a criação, constituição e publicização do Grupo Interdisciplinar de Estudos e Debates sobre Universidade Comunitária (GIEDUC), conforme as seguintes características, princípios e objetivos: O GIEDUC, Grupo Interdisciplinar de Estudos e Debates sobre Universidade Comunitária, é um grupo de estudos e de promoção e difusão do debate sobre a experiência de educação superior em geral e da educação superior comunitária em especial, constituído por pessoas de diversas áreas do conhecimento - docentes, discentes e funcionários de instituições de educação superior, bem como egressos de tais campos –, com caráter plural, sem vinculação partidária e sem fins econômicos, cuja atuação é pautada em decisões colegiadas, com fundamento nos seguintes princípios e objetivos:

Princípios

1 - Comunitarismo como valor necessário e preponderante nos processos educacionais e de produção de conhecimento;

2 - Pluralismo e laicidade de idéias e de concepções;

3 - Democracia como valor a ser materializado em todos os espaços da ação;

4 - Supremacia da colegialidade das decisões;

5 - Publicidade e transparência de ações;

Objetivos

1- Fomentar estudos e debates acerca da educação superior comunitária, buscando discutir métodos e formas de gestão participativa e estudar e divulgar experiências emancipatórias na educação superior nos contextos local e nacional;

2- Promover a articulação e a integração de docentes, discentes e funcionários de IES que comunguem os princípios acima elencados;

3- Realizar, promover e/ou estimular estudos, pesquisas, colóquios, jornadas, congressos, seminários, mesas redondas, publicações, manifestações e cursos sobre temas ligados à educação superior universitária comunitária.

Decidiu-se, ademais, que para a consecução de seus objetivos, o GIEDUC, formado originalmente pelos aderentes a este ato de fundação e aqueles que por ventura, após esta data, integrarem as ações do grupo, as deliberações serão sempre colegiadas, utilizando-se de lista virtual e o blog (universidadecomunitaria.blogspot.com) como espaços de divulgação e debate. Nada mais havendo, segue a presente ata assinada pelos presentes.